quarta-feira, junho 23, 2004

A Entrevista

Este post é extenso, mas conta uma experiência legal.

Pros que ainda não sabem, eu estou concorrendo a uma bolsa pra UAM - Universidade Autónoma de Madrid, pela minha universidade, a PUC-Rio. Resumindo a situação, é uma bolsa com despesas de passagem e custos locais cobertos.

6 vagas
60 candidatos


De acordo com meus primários e pobres cálculos, são 10 candidatos por vaga. Nunca fui estrela em Cálculo, e que por aí, já não começo bem. A proporção não significa que tenho que ser melhor do que 9 deles. Tenho é que ser, no mínimo, mais adequado do que os 54 que ficarão. E o pior: só tem fera competindo, de todas as áreas da graduação.

Ai, ai...

Bom, voltando: hoje foi minha entrevista. Deixa eu tentar realizar a situação pra vocês:

9 da manhã... Meu celular desperta. Por perdas de fatura, preguiça e falta de tempo juntas, no último mês ele só fez papel de despertador e catálogo telefônico mesmo. Lembro que tenho que ligar pra central de intercâmbio pra confirmar o horário de AMANHÃ - dia 24, e aí é outra saraivada de piadas - pra entrevista pra Autónoma de Madrid. Bem lembrado, até porque não tinha tirado isso da cabeça, cheguei ao trabalho às 9:30. O depertador tocou em Botafogo, comigo olhando a enseada. Minha mãe me liga às 10:
- Oi, meu filho! Como você tá?
- Bem, mãe! E você?
- Bem! Te ligaram da PUC...
- Intercâmbio?
- Sim! Sua entrevista é hoje às 18:10
- Brigado, mãe! - e vou encutar o diálogo.

Não preciso dizer que fiquei surpreso, não é? DETESTO ter que reorganizar coisas. Bendito seja Heráclito e mais ainda os voláteis requisitos de software - pra quem não reconheceu, acabo de usar de ironia.
Bom, o que fazer? Tinha que levar uns documentos que não estavam comigo etc etc... O pessoal do trabalho que me perdoe pelo inferno astral que é fim de período junto com processo de intercâmbio. Já perdi a conta, espero que seja o último furo nos próximos 2 meses, pelo menos... Acho que já começo a causar má impressão. Avisei que teria que sair às 15:30.
Correu o dia normalmente. Fiz o que tinha que fazer, fui pra casa 15:40, fiz a barba (OOOOOOOH, que barbão!) e peguei os papéis. Deu tempo de beber uma água de côco aqui na praia e pedir boa sorte pro Neguinho (o vendedor do quiosque) e prum outro camarada que é gente boa, mas sabe o que é? Esqueci o nome dele! rs...
No caminho pra faculdade, o carinha da Kombi me diz que o trânsito estaria ruim. Temi por perder o horário, e apostei que não estaria. Adivinha quem ganhou?
Particularmente, detesto condução alternativa, mas precisava chegar o mais rápido possível. Também detesto o cartel das linhas de ônibus, mas isso é material pra outro post.
Chegando à PUC, esbarro com alguns amigos e outros colegas, e chego à central de intercâmbio precisamente às 17:40. Fui recepcionado por: amigos e colegas de curso concorrentes e novos conhecidos, com exceção do Mário. Raramente perco a chance de me apresentar aos que ainda não conheço. Esperar até as 18:10 pareceu uma eternidade. O único que não me olhava com cara de "vou me dar melhor do que você" era o Mário - não vai querer saber "que Mário", né?

- Boa sorte!
- Boa sorte!
- Boa sorte!
- Boa sorte!
- Boa sorte!
- Boa sorte!

Era esse o mantra dos candidatos. Muitos candidatos, muitos concorrentes. Acho que a grande maioria devia ser bom. E ainda tem o tal do Roberto, CR 9 ponto muito... Gente, a Erica de Engenharia de Produção era muito legalzinha! Conversei com ela, antes de ela sair. Fui o último entrevistado do dia. :)


A Entrevista - O motivo do nome do post
Uma sala com 5 cadeiras. Dois à esquerda, dois à direita. Uma à frente. A coordenadora do intercâmbio. Bom, não posso mentir, senti um calafrio na espinha. Os da direita eu conhecia de vista - trabalhavam na própria CCI. Os da esquerda... Nunca os vi antes. Não preciso dizer que esqueci o nome de TODOs, não é? - Quase todos, na verdade.

Uma papelada em cima da mesa. "O que deve ser isso tudo?" ... FOCO, Santiago!
- Pode sentar. - Daniel, felizardo do qual me lembrei o nome.
- Ah, sim. Obrigado. - Eu, tentando ser o mínimo polido. - Boa noite a todos! - A voz saiu limpa e firme, sem que eu tivesse ensaiado :P
- Boa noite, Rodrigo! - Todos, com as vozes se misturando.
- Conte-nos, finalmente... Por que veio parar na Central de Intercâmbio? - a toda-poderosa e gentilíssima Rosa Meyer perguntou.
Os avaliadores foram ótimos. Não havia nenhuma tensão aparente. Percebia, entretanto, que a cada palavra havia uma reação gestual. Precisava ser eu mesmo, e falar o que tivesse pra falar, da maneira que sempre tentamos não deixar de ser numa entrevista. Infelizmente, a palavra "particularmente" teimava em surgir em cada frase. Estava ficando particularmente patético, até eu mesmo me chamar atenção:
- Nossa, estou falando demais essa palavra... Particularmente.
A mulher gentil à minha esquerda disse, amigavelmente:
- Talvez, mas você não tem muitos vícios de linguagem!

Pronto. Notei que:
  • Ela sabia avaliar o comportamento do candidato.
  • Eu nunca havia duvidado disso.
  • Nossa, até os vícios de linguagem! Quantos detalhes!


E assim segui. Me senti bastante confortável, a despeito da aparente pressão à qual se sentiu o candidato anterior. Perguntas feitas:

- Quais são seus objetivos?
Essa foi prontamente respondida:
- Exatamente o que disse na carta de apresentação...
- Cadê a carta? Cadê a carta? - Interrompendo-me, todos se perguntaram e remexeram os papéis, até achá-la. Eu resumi mais ou menos a carta, e pronto.

- Como veio parar na PUC? - Pra quem conhece, é aquela história do garoto que era curioso e blablabla... Precisei cortar 90% da história, mesmo achando uma das histórias mais excitantes da minha vida, porque sabia que o tempo era curto.

- Por que a Europa? - Ah, essa foi fácil, porque eu mesmo já pensava nisso antes. Tenho bem em mente o porquê das escolhas que faço.

- Por que escolheu esses professores pra te recomendarem? - Apesar de fácil de responder, essa causou um pouco de inquietação, especialmente quando falei sobre a frieza que em geral ocorre nos escalões mais altos do âmbito acadêmico. Notei que todos, sem excessão, se remexeram na cadeira. Felizmente, mantive a tranqüilidade e consegui segurar o ritmo, sem fazer parecer um protesto, mas sim meu parecer sobre o assunto. Em suma: os professores deveriam ser tão humanos quanto técnicos, e o problema é que muitos deles não se deixam aproximar dos alunos. Talvez um mecanismo de defesa contra os alunos mais "interesseiros" do que "interessados". Enfim, não sei mesmo. No fim, escolhi aqueles dos quais mais tive influências - Mauro Oddo, pelo interesse despertado por Economia e Administração, e Maria Tereza Baldas, pelas histórias sobre a Bolsa de Valores e pelo projeto que me rendeu o único 10 da turma, no período em que cursei a matéria Introdução à Modelagem. Coisas de quem curte análise de sistemas, um grande segredo guardado num curso de nerds, mal aproveitado pelos alunos, e que pode ser usado pra qualquer área de nossas vidas.

- Você mencionou que havia escolhas em sua vida que deram certo e outras não, em sua carta. Fale mais sobre isso.
Era a deixa. Prefiro esticar um pouco mais esse assunto, porque considero importante. Será o tema do próximo post ;)


No fim das contas, espero ter me saído bem. Na Central de Intercâmbio, certamente todos tiveram um dia estressante, mas é impressionante como aturaram o último aluno vindo com as mesmas ladainhas sobre esperança e planos futuros com um humor enorme. Parecia que era o primeiro que entrevistavam no dia.

Saí de lá me alongando todo e reclamando de sede (Olha a tensão revelada ae!). Como não podia deixar de ser, o crucial Mário me ofereceu nessa exata hora algo pra beber. Como sou abusado, aceitei sua oferta e bebi Coca-Cola lá na porta da coordenação mesmo, e não duvido que tenha sido da mesma garraga que estava na mesa dos entrevistadores.

Falar sobre as chances de ser escolhido pra ir no primeiro semestre de 2005? Prefiro esperar pra saber se passei pra segunda fase.

Ainda assim, sou matematicamente otimista:
60 candidatos.
6 vagas.
Só preciso de uma delas.

Nenhum comentário: