quinta-feira, março 20, 2008

Luiz Gonzaga - Caminho de Pedra

Hoje estava ouvindo essa música do Rei do Baião. Linda canção.

Luiz Gonzaga - Caminho de Pedra

Ela começa com uma melodia já bastante conhecida, citada na música Gabriela, do Tom Jobim. Grande reverência prestada ao maior Cearense de todos os tempos.

Se você reparar, toda vez que, fora do refrão, o Luiz Gonzaga alcança as notas mais altas, sua voz fica longínqua, ganha uma ambiência. É meio óbvio, mas se prestar atenção, vai ver que é um efeito curioso, que dá a impressão de que tem mais gente cantando junto. Mas ele está só. Foi por isso que resolvi postá-la.

É linda, meio melancólica e nostálgica. Sabe, de vez em quando eu conto essa história que lembrei agora pras pessoas. Vou deixá-la registrada aqui.

Meus avós, os pais do meu pai, são do Ceará. Viviam em Guaraciaba do Norte. Meu pai veio pro Rio ainda pequeno. João, meu avô, era muito parecido fisicamente com o Luiz Gonzaga. Minha avó, Iraci, era loura, linda, de olhos verdes.

Não tem muito tempo eu soube que meu avô era menestrel de folia de reis. Quase chorei quando descobri, mas isso havia sido há dezenas de anos atrás, enquanto ainda estava no Ceará. Mesmo assim, ele improvisou algumas poesias pra mim, como se estivesse conduzindo a folia. Isso foi nos últimos meses de sua vida.

Minha avó há muitos anos está entrevada numa cama, após ter sofrido um derrame que a deixou por pelo menos dois anos com a mentalidade de uma criança. Teve cinco filhos, criava porcos para vender, fazia comida pra fora, lavava roupa pros outros, tinha galinhas, rezava seu terço religiosamente, preparava o melhor café que já tomei (e só bebia o dela, não tenho esse costume) e preparava o meu baião-de-dois pra eu comer com as mãos junto com ela, direto da panela.

Com sua mentalidade recuperada, Dona Iraci está em profunda depressão, pois não pode fazer nenhuma destas coisas, e perdera seu companheiro. Meu avô se foi depois do terceiro derrame, depois que fora afastado forçosamente das biritas às quais era muito dado alcoolatramente. Uma crise de abstinência o fez contrair a pneumonia que o levou, e por um dia eu vi meu avô velhinho, velhinho, bem acabado, com tubos furos no pescoço, no dia em que morreu.

Antes disso, ele era o cara que sempre parecia com o Luiz Gonzaga. Quando eu era novo, novinho, havia muitas festas na casa deles, que reunia todos os filhos. Tudo era regado a muito Luiz Gonzaga. A família reunida era sinal de forró. Mas não é nada disso que quero contar.

O que contei serve de base pra entender o que vou contar agora: o Luiz Gonzaga parecia tanto com meu avô que, quando pequenino, com todo aquele baião tocando na casa dos avós, eu achava que o Luiz Gonzaga fosse da minha família. Talvez um tio que ainda morasse no Ceará. Pra mim, ele era meu tio, o Luiz Gonzaga.

2 comentários:

Nina Carolina Guimarães disse...

Apesar da parte triste, deu um sorriso no final. Crianças são puras e imaginam um outro mundo, bem melhor. Elas podem ser e ter o que quiserem. Muito manero ter um tio desses!
Bj!

Rodrigo Santiago disse...

É, é irado ter um tio assim... Eu tinha, até descobrir o contrário.