Enquanto assistia sua aula na faculdade, Demócrito pensava em como faria para entender todo aquele conteúdo até Sexta-Feira, data de sua prova. Pensou então nas coisas que deveria fazer - cuidar de sua casa, de seu trabalho, de sua faculdade, de sua namorada, de visitar seus pais, de tocar seu violão e se reunir com seus amigos, e finalmente de sua saúde.
Não sentiu o tempo passar, tampouco a loucura chegar, enquanto sentia aquela dor de cabeça lancinante, que começara há dois dias. Seus neurônios pareciam se mover como cobras emaranhadas, tal era a desarrumação e sensação de tonteira causada pela moléstia. Sua imaginação, aos poucos, ficou turva, e tudo o que pensava parecia começar a ser dividido em duas imagens. Os sons que ouvia estavam agora amplificados, quando sentiu um estalo dentro de si. Um estalo que saiu de todos os seus 'eus' - corpo, espírito e mente.
Fechou os olhos. Depois do estalo, tudo ficou silencioso. Abriu-os lentamente, para enxergar o mundo lá fora. Estava em uma UTI, ligado a aparelhos que monitoravam seus batimentos cardíacos e impulsos neurais. Prontuários médicos estavam dispostos em uma mesa de cabeceira, e Demócrito se perguntava quanto tempo devia ter se passado desde que tivera aquela sensação do estalo.
O rádio, que permanecia ligado na MEC, FM dizia: 14 de Agosto de 2005. 4 meses desde a última aula de Finanças que assistira.
Sentou-se sobre a cama, e viu-se preso àquela parafernália de equipamentos que o vigiava. Quando começou a pensar no que teria acontecido, a natureza do diálogo estava presente em sua mente. Demócrito agora percebera algo muito estranho - sua visão, que antes estava um pouco turva, quando se tornou nítida projetava duas imagens idênticas em sua mente, como os olhos de um camaleão faria. Ao se levantar, percebeu duas vontades que trabalhavam simultaneamente em seu cérebro - uma comandava a mão esquerda e outra a mão direita.
- O que é isso? - duas vozes ressoavam dentro de sua mente.
- Quem é você? - Percebeu duas consciências executando a mesma pergunta uma à outra. Havia um estranho na mente de Demócrito, mesmo que nada parecesse tão estranho no que aquelas duas criaturas em sua mente comandavam. Era ele próprio, em cada uma delas.
Desde que acordara, as pessoas não compreendiam o rapaz, e consentiam com sua loucura de se referir a si mesmo como "nós" ao invés de "eu". Afinal, Demócrito - ou Heráclito, como também começou a admitir ser chamado - tornara-se brilhante em tudo o que fazia, desde aquele pico de estresse que o levou a um coma de 4 meses. Parecia ser "dois em um".
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