sexta-feira, março 27, 2009

Tabu e Hipocrisia

Já pararam pra pensar que, quanto mais a sociedade derruba tabus, maior é a hipocrisia do homem? Não que seja uma o motivo da outra, mas parece que são correlatas de alguma forma. Eu sinto que nos lugares onde há a atitude religiosa fundamentalista, a comunidade é guiada por um senso de justiça local supremo. Chame esta vissicitude de fanatismo. Mas os fanáticos em geral ao menos servem de todo o coração e em sua maior parte são verdadeiros e coerentes os seus sentimentos, suas palavras e suas ações.

Esta sacralidade dos atos dá aos homens a sensação de estarem sendo observados 24 horas/dia por sua divindade. Ela não dorme, não descansa e é infalível. Sua vontade não pode ser julgada por homens, e o que quer que aconteça é devido à permissão dada pelo divino.

Nas sociedades modernas (portanto, mais céticas), a sacralidade é perdida. Todas as leis são acordadas entre homens. Nestas comunidades, criadores e criaturas se misturam. O sistema é desenhado e redesenhado por mortais. Aqueles que cumprem são os mesmos que fazem. O poder do ego é grande nestes casos. Se um indivíduo julga necessário roubar para continuar sobrevivendo, ou se julga matar necessário, cria-se um mini-tribunal instantaneamente. O infrator sabe que não pode ser pego por Deus - Ele tende a "não existir". E sabe que dos outros homens, pode tentar escapar. Afinal, são seus iguais.

Nós precisamos de um "inimigo" externo. A consciência de que existe um Deus (ou vários) à sua espreita aumentam as chances de você obedecê-lo(s), uma vez que você não compreende a natureza de tal criatura.

Na sociedade moderna, palavra, ação e sentimento podem ter caminhos completamente diversos. Neste momento, surgem os vícios, as mentiras e a violência.

Como exemplo, posso citar o filme Watchmen. Concordei plenamente com seu desfecho. Quantos filósofos já não disseram que o nacionalismo é o diabo?

Analogamente, a forma de "criação e recriação" que se manifesta nas artes pela web é um modelo claro de que os homens não estão dispostos a absorverem material de outrem sem reeditá-lo e repassar à frente com seus próprios valores embutidos. O mundo digital segue esta regra, e ele é o fruto mais transparente da vontade humana.

Para uma sociedade mais civilizada, mais respeitosa e verdadeira, os tabus devem cair. Mas a sacralidade deve continuar, do contrário, corremos o risco de nos tornarmos uma sociedade completamente injusta.


Este vídeo
é sobre um homem que resolveu viver biblicamente durante um ano. Seguindo o máximo de preceitos que conseguisse. Muito interessante.


Este outro vídeo
mostra o estudo de um cara sobre trapaças, bolsas de valores etc. Muito instrutivo também.

sexta-feira, março 20, 2009

Sobre Jornais e Mídia

Os grandes jornais do mundo estão sob perigo de extinção. Vamos colocar sob o ponto de vista mais clássico: os Tiranossauros estão face-a-face com um meteoro astronômico. É a web com seu livre tráfego de informações.

A sabedoria popular nos diz que os super jornalistas estão empregados nos super jornais. Esse sentimento é tão íntimo e a intuição tão verdadeira que achamos um absurdo esses grandes jornais terem sua receita reduzida por causa da web. Afinal, essa reportagem de alta qualidade é indispensável, e em tese, precisamos pagar por ela. De outra forma, estaremos alienados do mundo, certo?

Eu tenho aqui um pensamento, e quero compartilhar com você. O jornal, da maneira como o conhecemos, é idéia passada. Acontece que, agora, você passa muito mais tempo consumindo informações de sua 'vizinhança' do que indo aos jornais. Coisas de blogs, redes sociais, twitters dos seus amigos. Hoje você tem muito mais amigos do que na sua infância. Se você ainda está na infância, esse é um momento de sorte. Eu sei o que é ter menos de uma centena de pessoas sabendo o que eu estou fazendo.

O maior e mais crescente truque dos jornais para manter suas vendas é o escândalo. O escândalo é trivial, interessante e completamente dispensável. Mas atrai a atenção.

Os últimos hits campeões de venda de jornais são todos sobre crianças. Estupro, violência, roubo, cárcere de criança, até criança grávida de outra criança. Será que estas coisas nunca aconteceram? De repente o mundo ficou pior? Ou essa foi a fórmula mais recente pra vender jornais?

Nenhum papel impresso pode me trazer o acontecimento mais importante da semana. Tampouco uma matéria online. Mas é óbvio que na internet eu consigo muito mais informações sobre um assunto de meu interesse do que em um jornal. Eu não precisava dizer, mas alguns hão de ter como surpresa de que o número de acontecimentos importantes é muito maior do que o número de páginas de um jornal. O número de olheiros que uma instituição dessas tem é muito menor do que o número de lugares onde eles devem estar. A história se conta assim: você deve estar no lugar certo, na hora certa. Nenhum jornal pode estar em todos lugares ao mesmo tempo no mundo. Só no Big Brother você consegue ter gente o suficiente olhando tudo ao mesmo tempo. Mas nem tudo passa percebido. A interpretação de um fato é característica intrínseca de um indivíduo, e é provado que nós geralmente não enxergamos o que não esperamos enxergar, por isso o óbvio muitas vezes passa à nossa frente com uma melancia pendurada no pescoço e não damos bola.

Cercar todos os espaços durante todos os segundos com olhos suficientes cujas cabeças são compreensíveis a tudo instantaneamente... Isso é impossível hoje. Por isso, acho que os jornais são em geral cegos aos 'grandes fatos'. Aqueles que realmente mudam as nossas vidas. Não até que elas já tenham mudado. Um exemplo disso é, e eu hei de me orgulhar disso, a cultura geek, dos nerds. Todas as grandes inovações em redes sociais foram inventadas pelos nerds. Eles hackearam a sociedade e o jeito de se relacionar das pessoas. Na minha adolescência, a cultura online era ignorada pelos demais. Hoje ela é onipresente e consumida em excesso pelas mesmas pessoas que me criticavam há dez anos atrás.

A limitação no escoamento de informações relevantes é diminuída pela web. Um exemplo disso é o TED, uma conferência a quem fui apresentado há poucos dias por um amigo. Se eu fosse você, assistiria a um vídeo por dia, pelo menos, aqui no youtube. Com mais de quatrocentos vídeos publicados, a maior (mas não única) conferência de design, tecnologia e entretenimento do mundo colocou à disposição dos habitantes do planeta não excluídos digitalmente todo o acervo das palestras que executa. Significa que, durante o ano inteiro, você pode assistir a todos os vídeos, um por dia. Tomar sua dose de lirismo e inspiração junto com o café da manhã e partir pro trabalho. Você não vai consumir tudo antes que eles coloquem outras mil palestras online, com mais tantas idéias novas que só de pensar eu me deleito.

Então... O que sobra pros jornais? Alguém vai me dizer que é importante monitorar o que o governo anda fazendo com o dinheiro do contribuinte. Isso é uma verdade. Por isso as novas iniciativas de governo transparente surgiram com a web. Dois exemplos: Obama e Gabeira. Quer mais? Petition online. Os resultados de investigações e CPIs, a denúncia da violência urbana... Tudo isso hoje é o papel de um jornal. E por isso as pessoas pagam. A arte já não tem a mesma graça quando lida, depois da invenção do myspace.

Mais pra frente, teremos estruturas que permitirão ao curioso ocasional checar se está tudo bem com as contas do governo através da internet. E caso não esteja (o que geralmente será verdade), ele poderá publicar sua denúncia. Com o potencial de difusão das redes sociais, os escândalos governamentais serão propagados em vídeo por pessoas como eu e você, totalmente comuns, que terão sua glória adquirida por desempenhar o papel de vigilante voluntário. Não totalmente voluntário, uma vez que os mais empreendedores e obstinados irão lucrar pessoalmente com isso - é o ressurgir daquele moleque na idade média que saía gritando as notícias recentes pela vizinhança.

Acho que já descorri demais e você entendeu a idéia. Não tenho outro ponto a não ser este: os jornais diminuirão de tamanho. Não fazem muito mais sentido. O problema não é "qual é a saída para os jornais?", mas sim "qual é a transformação que se dará?". Porque, afinal, com qualquer blog online, gratuito ou muito barato, qualquer grande jornalista pode ter seu próprio veículo de notícias, e ser muito mais autêntico e simpático do que qualquer grande marca sem um rosto.

(Edição)

Acabo de encontrar esse vídeo interessante no TED, de uma palestra dada pelo fabuloso Tim Berners Lee, inventor da internet. Tem tudo a ver com o que escrevi aqui: