quarta-feira, março 26, 2008

Coração de Papel

Queria sinceramente entender esse Coco, da Dona Cila do Coco.

A senhora do Engenho do Bom Jardim
Mandou um carro pra mim com dois botões
No sereno tem gente que está roendo
Amanhã vai morrer do coração

Coração, coração
Ele não é de papel
Estou cantando este Coco
Em homenagem a Michel

Michel, Michel,
Cabeça de papel

Entra Michel pra comer papel


Vidão

quinta-feira, março 20, 2008

Luiz Gonzaga - Caminho de Pedra

Hoje estava ouvindo essa música do Rei do Baião. Linda canção.

Luiz Gonzaga - Caminho de Pedra

Ela começa com uma melodia já bastante conhecida, citada na música Gabriela, do Tom Jobim. Grande reverência prestada ao maior Cearense de todos os tempos.

Se você reparar, toda vez que, fora do refrão, o Luiz Gonzaga alcança as notas mais altas, sua voz fica longínqua, ganha uma ambiência. É meio óbvio, mas se prestar atenção, vai ver que é um efeito curioso, que dá a impressão de que tem mais gente cantando junto. Mas ele está só. Foi por isso que resolvi postá-la.

É linda, meio melancólica e nostálgica. Sabe, de vez em quando eu conto essa história que lembrei agora pras pessoas. Vou deixá-la registrada aqui.

Meus avós, os pais do meu pai, são do Ceará. Viviam em Guaraciaba do Norte. Meu pai veio pro Rio ainda pequeno. João, meu avô, era muito parecido fisicamente com o Luiz Gonzaga. Minha avó, Iraci, era loura, linda, de olhos verdes.

Não tem muito tempo eu soube que meu avô era menestrel de folia de reis. Quase chorei quando descobri, mas isso havia sido há dezenas de anos atrás, enquanto ainda estava no Ceará. Mesmo assim, ele improvisou algumas poesias pra mim, como se estivesse conduzindo a folia. Isso foi nos últimos meses de sua vida.

Minha avó há muitos anos está entrevada numa cama, após ter sofrido um derrame que a deixou por pelo menos dois anos com a mentalidade de uma criança. Teve cinco filhos, criava porcos para vender, fazia comida pra fora, lavava roupa pros outros, tinha galinhas, rezava seu terço religiosamente, preparava o melhor café que já tomei (e só bebia o dela, não tenho esse costume) e preparava o meu baião-de-dois pra eu comer com as mãos junto com ela, direto da panela.

Com sua mentalidade recuperada, Dona Iraci está em profunda depressão, pois não pode fazer nenhuma destas coisas, e perdera seu companheiro. Meu avô se foi depois do terceiro derrame, depois que fora afastado forçosamente das biritas às quais era muito dado alcoolatramente. Uma crise de abstinência o fez contrair a pneumonia que o levou, e por um dia eu vi meu avô velhinho, velhinho, bem acabado, com tubos furos no pescoço, no dia em que morreu.

Antes disso, ele era o cara que sempre parecia com o Luiz Gonzaga. Quando eu era novo, novinho, havia muitas festas na casa deles, que reunia todos os filhos. Tudo era regado a muito Luiz Gonzaga. A família reunida era sinal de forró. Mas não é nada disso que quero contar.

O que contei serve de base pra entender o que vou contar agora: o Luiz Gonzaga parecia tanto com meu avô que, quando pequenino, com todo aquele baião tocando na casa dos avós, eu achava que o Luiz Gonzaga fosse da minha família. Talvez um tio que ainda morasse no Ceará. Pra mim, ele era meu tio, o Luiz Gonzaga.

quarta-feira, março 19, 2008

terça-feira, março 18, 2008

A Vaga Era

(Rodrigo Santiago e Manu Santos)

Esperando acontecer o que sempre sonhei
Nas eras vaguei
Pois não seria à era do esperar
Que aconteceria o que sonhara

O sonho é dos que dormem
Fazer é para os lúcidos
Acordar, mesmo enquanto não dormia,
Foi o que precisei aprender

Vagando até o final desta era de sonhos, vi-me:
Pá, pedras, chão e cal
Deveria construir minha vida
Com minhas próprias mãos,
Gratidão,
E sob o guarda-chuva
Da divina vontade de Deus



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Para Aprender

Eu sigo a um propósito: aprender. Posso ter qualquer cara que queira.

segunda-feira, março 17, 2008

Seresta Moderna na Sala Baden Powell

Da esquerda para a direita:
Manu Santos - Voz
Radamés Lago - Percussão
João Francisco - Voz, Violões, Arranjo e Direção Artística
Juli Mariano - Voz e Pesquisas
João Gabriel - Piano
Rodrigo Santiago - Samplers, Percussão, Violão e Voz





A lente é de Marco Sobral.

sexta-feira, março 14, 2008

Por Que o Google Cresce Todo Dia?

É fácil de explicar.

O sonho do Zé da padaria é poder atender todos os consumidores com qualquer item que precise. A localização geográfica em si, o ponto onde as pessoas passam para comprar algo é apenas um embuste para a oportunidade do vendedor.

A localização do imóvel comercial não é o negócio. Mas conveniência da localização é o fator chave para que a tal oportunidade de venda aconteça, com a presença do consumidor. Por que tantas padarias e botecos funcionam em frente a um ponto de ônibus? Infelizmente, a padaria não tem todos os itens do mundo, senão seria de interesse de qualquer pessoa entrar lá para comprar algo. Além disso, é limitado o número de pessoas interessadas em entrar em padarias. Pior ainda é a Lei da Impenetrabilidade da Matéria: dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Como acomodar todos os itens e todas as pessoas do mundo nas finitíssimas prateleiras e corredores de uma padaria?

Simples assim: o McDonalds compra 10 imóveis em um lugar desabitado, e instala uma única loja. As pessoas começam a freqüentar aquela loja. O McDonalds vê os outros imóveis valorizarem pelo aumento de circulação de pessoas. Daí, aluga todas as outras 9 lojas por um valor abusivamente alto. Os donos dos negócios instalados nas lojas, digamos, de cachorro quente e móveis de escritório, suam a camisa pra pagar o aluguel e tirar seu lucro. O McDonalds está comendo os lucros dos cachorros-quentes e dos móveis de escritório, vendendo-os indiretamente. Para quaisquer outros negócios que venham a se instalar naquela zona de 9 lojas, o McDonalds estará lucrando diretamente com um outro negócio que não é diretamente o dele. Ele pode vender qualquer coisa, mas não tudo ao mesmo tempo (varia de acordo com o tipo de loja instalado ao redor do McDonalds). Ele pode ter qualquer tipo de freqüentador, mas não todos ao mesmo tempo (idem para os tipos de loja que acabam surgindo por ali).

O Google FAZ isso. Vende tudo, pra qualquer tipo de pessoa, ao mesmo tempo. Virtualmente, ele inventa um site de utilidade pública. Mas ao invés de vender o serviço (como o Gmail, vários outros serviços de email são assinados e cobram uma taxa periódica), ele o fornece DE GRAÇA. E-mail com 6 gigabites de espaço (dá pra guardar a narrativa da minha vida iteira lá em formato de texto) é de interesse de qualquer médio internauta.

Com o serviço prestado, qualquer local virtual do Google (o site de busca, ou o Gmail, por exemplo) é bastante conveniente. Ele tem milhões de freqüentadores que verificam aquela telinha a cada 10 minutos, umas 8 horas por dia, sei lá.

Dado que o local é abusivamente conveniente, falta apenas o produto. E o que o Google vende? Resposta: o produto dos outros. Qualquer produto.

O Google subverteu a lógica tradicional das lojas. É como se pessoas do mundo inteiro freqüentassem a "lojinha Google" porque lá estão dando chocolate de graça, 24 horas por dia, todos os dias da semana. Daí, os agentes do Google ficam ouvindo as conversas de todos os milhões de freqüentadores. Ele tem um vendedor pra cada pessoa que entra nela. Esse vendedor fala a língua da pessoa, entende o assunto, e logo em seguida oferece um produto, intrometendo-se.

Imagine a cena abaixo:

Henrique entra na lojinha do Google e encontra Mateus, seu amigo de infância. Um terceiro rapaz, empregado da loja, de nome Ricardo, que tem cabelos grandes, usa óculos e uma camisa do Iron Maiden - o vendedor nada perfeito - chega perto deles e ouve atentamente o assunto:
- Fala, meu compadre! - Henrique.
- Fala, Bro! - Mateus.
- E aí, foi bem de viagem?
- Pô, do Centro pra Santa Cruz é chão.
De repente, o Ricardo, se intrometendo:
- Ahn... Com licença. Você gostaria de viajar? Tenho aqui um pacote inesquecível para você e sua família.
- E sua irmã? - Henrique.
- Ah, está ótima, chegou mortinha de cansaço - Mateus.
- Que tal um relaxante muscular pra vocês? - Ricardo.
- Olha, semana que vem vamos ao show do Paralamas, tá a fim? - Henrique
- Excelente! Vambora! - Mateus
- Olha, tenho ingressos para o show do Paralamas a dez Reais. - Ricardo.
- Ôpa, Ricardo. Como é que é o esquema? - Mateus.
- Toma aqui esse endereço de Internet. É lá. - Ricardo.
- Pô, demorou! Maior adianto, aê... - Mateus.
Mateus sai da lojinha Google, onde fica seu amigo Henrique1, aparentemente falando com as paredes, e Ricardo por perto, sempre a oferecer as coisas mais esdrúxulas. Dirige-se à outra lojinha da Ticketronics, onde compra de William um ingresso a dez Reais para o show do Paralamas:
- Ô, meu velho, tá aqui a tua grana - Mateus.
- Beleza, bro, tá aqui teu ingresso - William.
Com a saída de Mateus, William se vira para Tatiane, sua colega de trabalho:
- Ô Tatiane, leva aqui um Real lá pro Ricardo. Manda ele oferecer pra mais cem pessoas os ingressos pros Paralamas a dez Reais.

quinta-feira, março 13, 2008

Anonymous Coward

From Wikipedia
"Anonymous Coward" is a term applied within some online communities to describe users who post without a screen name; it is a dummy name attributed to anonymous posts used by some weblogs that allow posting by people without registering for accounts. The practice, which had its roots in BBS and USENET culture, was made especially popular on Slashdot, where the mildly derogatory term is meant to chide anonymous contributors into logging in. Some weblog engines such as Scoop use the term "Anonymous Hero" instead, perhaps to avoid the name's confrontational nature. Others use stronger varieties, like Plastic.com's "Anonymous Idiot", and SuicideGirls' "Random Fuckbag".
Cuidado com eles.

Yôga Na Praia



Este é o Edu. E a foto é iradíssima.

Margarida Verde



Gostaram do novo banner?

terça-feira, março 11, 2008

Nega Panela

(Rodrigo Santiago e Manu Santos)

Nega Panela batendo canela
No samba crioulo de Dona Sinhá
Traz os quitutes em potes de lata
Fazendo os quindins, os quindins de Iaiá

Nega que canta, balança
Com todos os doces no colo de Sol
Levando cocada na prata, imitando ganzá
Contando da nova iguaria
Que vem confeitada de favos de mel

Fazendo os balagandans, remelexos
E breques-te-breques no chão

Nega que empina a moringa
Na ponta dos dedos e inventa refrão
Não pára, repara
Que eu gosto de ouvir o teu som
De cuias, cumbucas e dos tabuleiros
Batendo na colher de pau

Fazendo os balagandans, remelexos
E breques-te-breques no chão



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A gravação em voz e violão está aqui:
Nega Panela (mp3)

Qualidade baixa e sem produção, só pra ficar o registro.

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segunda-feira, março 10, 2008

Performance



Esta foto foi uma das melhores da série Manu Santos. Está sem tratamento, foi tirada na Lona Cultural Hermeto Pascoal.

sexta-feira, março 07, 2008

Dezessete Bilhões de Anos

Naquele dia, sua casa estava cheia. Estrelas, astros, vias lácteas, todo mundo estava lá. O homem escuro, de barbas brancas, pesadas, das profundezas de seus dezessete bilhões de anos, se recusava a soprar as velinhas. Ele olhava em seu interior, e via na euforia dos pequeninos seres que dentro dele viviam um motivo pra comemorar: era seu aniversário.

Será que eles não cansavam? Ficavam a dar voltas em seu Estomacal Sistema Solar, contando uma parametrização de unidades de tempo totalmente harbitrárias. Yugas, anos, nanossegundos, bits, luas. Em cada momento era uma coisa. Eles não se cansavam.

Sentiu frio. Colocou seu casaco de matéria escura. As barbas estavam de molho há incontáveis giros do Sol. Incontáveis mesmo. Isso é coisa de um povo da Terra. Agora, sentia pena.

Havia muitas coisas inexplicáveis aos seres intrínsecos deste ser. E muitas coisas inexplicáveis a este ser sobre os seres intrínsecos. Por mais que fosse onipotente, não os controlava. Por mais que fosse onisciente, haviam segredos indecifráveis. Por mais que fosse onipresente, não era notado.

Entristecia-se. Seus remédios não funcionavam mais. Estava com dezessete bilhões de anos, e nada mais parecia resolver a tendência destes micróbios de se autodestruírem. Parecia muito com aquilo que eles próprios inventaram, que se chamava Câncer.

Cada criação boa correspondia a uma ruim. Viviam segundo as leis do equilíbrio, do Ying e do Yang, que descobriram, mas sobre à qual fechavam os olhos e fingiam nada saber.

"Estes serezinhos que vivem dentro de mim. São uns insanos. Ao taparem os ouvidos à minha voz, criam seu próprio circo de loucura, enxergando vários super-seres que podem governar suas vontades espirituais. Grande necessidade espiritual de merda, estas coisas todas que lhes aparecem não existem. Eles não sabem que estão em mim. Cavam-me buracos, de dentro pra fora. Irrompem em explosões. Desnutrem parte do meu corpo... Eu estou ficando obsoleto."

Olhando no espelho, vê um outro universo: o de sua imaginação.

"Eles foram todos feitos segundo minha vontade, à minha imagem e semelhança. E eu era tão bom, tão íntegro, tão perfeito. Eu era tudo o que eles precisavam. Eu era o centro de tudo. Eu era o mais poderoso. Eles eram tão parecidos comigo. Eu os fiz exatamente assim, como eu. Justo eu, que sou tão belo, tão majestoso, tão divino..."

E, piscando, afasta-se do espelho, abaixando lentamente seu olhar, como que resignado.

"Onde foi que eu errei?"


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Louco Maracatu




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Berlinda




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quinta-feira, março 06, 2008

Mágoa e Perdão

O que disseste era menos que devia
Tu espalhaste mil mentiras pelo chão
Acumulou a rasa dor que não podia
E transformou numa tormenta sem sentido

Saindo agora com a face tão despida
Que parecia ter falado com razão
Pois eu te digo, não conheces o efeito
Do bom convívio e do poder da humilhação

Amargarás tudo lá fora
Quando cuspir acusações
Porque aqui dentro, em família,
É bem mais fácil
Magoar e ter perdão



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terça-feira, março 04, 2008

Efemeridade Individual e Pública

Lendo um texto do meu amigo Jorge Maia, tive o seguinte insight:

Descobri que a efemeridade da opinião pública baseia-se inteiramente no coletivo da efemeridade da opinião individual. E descobri em mim mesmo, enquanto selecionava textos do meu blog para registro. Imagine o que acontecia toda vez que eu prometia ou me comprometia com algo em algum texto? Eu esquecia, logo em seguida.

Estou envergonhado pela minha falta de direção. O que foi bom é que eu realmente nunca parei de escrever, e isso eu nunca prometi. Se tenho um grande hiato de publicações no blog, me agrada o simples fato de os textos destas datas não terem sido escritos lá, mas estarem em cadernos. Quase uma dezena deles.

Quanto aos jornais, só uma coisa não muda nunca: a Fernanda Montenegro sempre vai ser a maior atriz do país, em qualquer jornal, em qualquer data.

sábado, março 01, 2008

Sobre Os Cílios

Hoje eu estava com meu amor nos meus braços quando reparei mais uma coisa encantadora. Ela tem cílios lindos. Isso me levou a um monte de pensamentos. Ligo daqui, ligo de lá, e chego à seguinte conclusão: na entrada da Melt, seguranças enormes asseguram que indivíduos indesejáveis não entrem. Nas entradas da boate-corpo-humano, são os pelinhos nossos seguranças.

Vou desenvolver esta observação um outro dia, quem sabe. Concentrando-me nos cílios, hoje sou um cara culto no que diz respeito à ginástica dos femininos. Um dia, enquanto ia para o trabalho, encontrei uma amiga no ônibus. Nessa época, nosso ganha-pão ficava num lugar a uma hora da nossa casa. Conversa vai, conversa vem, minha amiga saca de sua bolsa um estojinho de maquiagem. Disse que economizava tempo se fizesse sua pintura facial dentro da condução. Com um espelhinho minúsculo, ela iria começar sua arte. Base, blush, baton, sombra, rímel, perfume, escova, corretor, lápis, e tantas outras coisas que só a vaidade feminina são capazes de conceber saltaram de dentro do estojinho, não necessariamente nesta ordem. Comecei a ver uma fumacinha em torno do rosto dessa menina, parecia uma briga entre mãos e face, tipo desenho animado. Só de pensar naqueles cheiros e pozinhos todos sendo aspergidos no ar a menos de cinqüenta centímetros do meu rosto dentro do ônibus me dá vontade de espirrar.

Tudo transcorria na pressa e prática femininas típicas, quando DE REPENTE... De repente, ela sacou um item esquisito da bolsa. Um objetinho pequeno, metálico, com pegadores tipo uma tesourinha, mas com dois arcos que se encontravam na ponta, ao invés das lâminas. Parecia um objetinho de tortura, com a armação bem intrincadinha. Coisa de mulher mesmo, sabe? Quando ela se olhou no espelhinho, pegou a tesourinha esquisita e aproximou-a meticulosamente dos olhos - ficando até com a ponta da língua projetada pra fora dos lábios, lateralmente - como se estivesse mirando o negocinho na cara, eu pensei que fosse sacar as órbitas oculares pra passar maquiagem por dentro. Essa parte branquinha dos olhos realmente não tem nenhuma graça. É tão neutra...

Finalmente, ela chegou ao seu alvo. O problema não eram as órbitas. Eram os cílios. Ela enforcou todos, de uma vez. Apertou os cílios entre os arquinhos do negocinho que parecia uma tesoura. Primeiro os da pálpebra superior direita, depois os da pálpebra superior esquerda. Vixe, parecia que ela ia arrancá-los todos fora, ou então que estava a sufocá-los! Por alguns segundos, aquela cara de garota arteira com a língua pra fora apertando os cílios dava a entender que tinha raiva deles. E eles pareciam todos se espicharem pra cima, como se dissessem "por favor, eu não tenho nada com isso!! Pare, não estou conseguindo respirar! Não fui eu! Não fui eu!". Esse tal "espichador de cílios" deixou-os todos pra cima, e após isso, quando ela guardou a tal tesourinha, tinha os olhos parecidos com os de uma boneca da Estrela.

Que coisas mais sinistras a alma feminina é capaz de criar para si própria. Quando eu achava que não havia mais nenhum método... Após as cirurgias de estômago, aspiradores-de-gordura, lingeries-super-apertadas, removedores-de-pedaços-de-pele, arrancadores-de-pêlos-de-partes-super-sensíveis, puxões-de-cabelo-,-cauterizadores-e-afins, banhos-de-chocolate (essa é realmente uma frustração de não poder comer chocolate muito estranha) e toda a sorte de apertões no corpo aos quais se submetem as mulheres para, teoricamente, ficarem mais bonitas... Nem mesmo os cílios foram poupados. Não bastou o rímel. Tinha que ter alguma dor no meio do processo.

A epopéia do embelezamento feminino é muito irônica. Para se tornarem mais belas, mulheres se submetem aos tratamentos mais dolorosos, PERIODICAMENTE. A cantiga do feminismo prega que as mulheres devem ter direitos iguais aos dos homens, e isso significa estarem sempre lindas de morrer. Seria melhor dizer "lindas até quase morrer". Se fosse uma religião, teria o seguinte mote: "a mulher deve se livrar do corpo em que veio e comprar um novo nas liquidações".

Para se purificar de seus pecados, minha companheiríssima decerto também utiliza seu subconjunto do universo de métodos embelezadores. Mas não precisa de enforcadores de cílios.

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